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Ocorreram-me inúmeros motivos para não o fazer. Não perceber um cú de fotografia, nunca ter tido uma conversa profissional sobre moda, trabalhar na pacata localidade da Terrugem (que aposto, uns bons 90% de vós não faz ideia onde é) e, na altura, não ter sequer máquina fotográfica. Esse detalhe, resolvi com a ajuda dum amigo, os quase 40 km de distância de Lisboa e eventuais faltas de jeito nem tanto. Eu gostava de vos poder dizer (e de resto, até dava bastante mais estilo) que nada disto me dá grande trabalho. Que as fotografias aparecem a toda a hora, que alguns dos
posts mais especiais não surgiram precisamente por via da minha falta de disponibilidade para me cruzar com gente na rua, que nunca foi necessário recorrer a um despertador para assegurar que determinado texto é publicado a tempo e horas, que me sinto sempre inspirado para os escrever, que nunca deixei de fazer nada por causa do blogue ou que este nunca me trouxe nenhum dissabor. A verdade é que não é bem assim. Por outro lado, acho que é precisamente esta dedicação que me permite gozar a alegria dos bons momentos que o
alfaiate me proporciona. Mas sou-vos sincero. Acham que nunca pensei que fazia figura de otário a abordar desconhecidos? Pensei claro. Acham que nunca me ocorreu que a única coisa que consegui com isto foi negligenciar a minha carreira profissional e minar a minha vida sentimental? Ocorreu claro. Mas também é justo admitir que o blogue e a dedicação que lhe tenho me ajuda pôr de lado as minhas frustrações profissionais, desilusões amorosas ou o que quer que seja que me ande a lixar o juízo. E depois há momentos sublimes. Como o
mail duma senhora que me pedia uma dicas sobre o que deveria levar vestido à ópera, aquele outro dum alto cargo da Lacoste Portugal que, por causa
disto, dizia que ficava a aguardar morada, tamanho e tonalidade para me enviar dois pólos, um para mim, outro para o meu pai (quando se recebe um
feedback da própria Lacoste com conjugações do verbo fascinar é complicado não se ficar com a sensação que uma simples brincadeira foi bem mais longe do que alguma vez se poderia ter imaginado). Ver a reacção da minha irmã ao meu presente de Natal, ouvir, em plena entrevista ao Rádio Clube, comparar-se o que faço à obra de Henry Miller (caro Aurélio, foi a observação mais descabida e sobrevalorizada que já ouvi sobre o
alfaiate, mas foi também, sem margem para dúvida, aquela que mais dentes me deixou à mostra) ou escutar o
Pedro Rolo Duarte ler excertos dos meus textos (a última vez que ouvi alguém ler em voz alta alguma coisa que eu tivesse escrito estava a meio da correcção dum teste de Filosofia e a minha professora do 10º ano tentava humilhar-me perante toda a turma lendo uma resposta minha que evidenciava, essencialmente, pouco estudo e muita imaginação). O blogue faz-me bem. Eu, que tenho fama de agressivo e irascível entre os amigos, dou aqui azo a um
alter ego que, sem querer entrar em filosofias baratas ou esoterismos bacocos, me dá sempre uma visão mais animada do mundo, daqueles que o percorrem e de tudo o que gira à sua volta. No fundo é isto que me faz ter o blogue. Dá-me energia. Da boa. Talvez por isso me custe tanto perceber a índole de meia dúzia de cavalheiros que já me abordou na pista do Lux, enquanto dançava tranquilamente sem incomodar vivalma, a insinuar que não me visto o suficiente bem para “ter a mania” / “me julgar” / “andar para aí armado” em
alfaiate como se, aquilo que aqui escrevo, fosse feito de alguma presunção ou visasse provocar-lhes qualquer tipo de comichão; como se, aquilo que aqui escrevo, tivesse por propósito causar incómodos a terceiros ou maltratar quem quer que seja – caríssimos, tudo o que vos tenho a dizer é que o Lux continua a ser a discoteca onde vou com mais frequência, e que me encontro desde já disponível, caso seja vosso desejo, para trocarmos umas chapadas lá fora, desde que, detalhe importante, longe da entrada, que não me quero ver impedido de lá entrar. Resumindo. Havia 1001 motivos para não ter iniciado este blogue. Motivos racionais, concretos e convincentes. Mas avancei. E, um ano depois, dou-me feliz por isso. Rejubilo com a ideia de saber que há quem encare este blogue como um livro de crónicas cujas páginas vai virando diariamente, com a mesma disciplina que eu sintonizo a TSF, 5 minutos antes das 9h, para ouvir os
Sinais do Fernando Alves ou, com a energia que abria a Visão no tempo das crónicas do António Lobo Antunes (não estou a comparar as minhas fotografias amadoras ou as idiotices que aqui escrevo com o trabalho destes senhores, queria apenas agradecer àqueles que me fazem sentir um bocadinho como eles, só isso). Porque no fundo essa era uma das coisas que eu gostava de ser quando fosse grande. Cronista. Até porque, essa é a única ocupação que me merece juízos pessoais sobre quem a desempenha. Porque a crónica dum indivíduo é sempre o próprio indivíduo. E é por isso que fico contente quando estranhos me dizem que gostam do meu blogue. Porque no fundo, sinto que esses estranhos gostam também de mim. E fico feliz por isso. Pode ser?