terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Ayres - Um alfaiate portuense em Savile Row



Este post começou a ser desenhado em pleno dia de Natal quando, espantado por ver uma fotografia deste “vizinho” seu, o Ayres me escreveu dizendo que, se algum dia regressasse a Savile Row, teria todo o prazer em me receber no atelier onde trabalha. Esperem lá, não é bem isto. Assim é que é: este post começou a ser desenhado em 1960, no 120 da Rua Gonçalo Cristóvão no Porto quando um outro Ayres, avô deste que aqui vos trago, abriu a Ayres Alta Costura, onde se vestiam ilustres portuenses como o José Maria Pedroto ou o Francisco Sá Carneiro. Foi neste ambiente que o Ayres cresceu e foi por alturas da sua adolescência que decidiu que rumo queria levar. Ainda hoje, numa das gavetas da sua mesa de corte – a que vêem na foto – traz um livro chamado Sistema Maguidal que aparenta um ar mais gasto que os Missais do século XVIII da minha mãe. Esse livro tem uma morada – a Rua da Palma em Lisboa – e o Ayres desceu até cá para saber se havia quem o pudesse ensinar. O velho Mestre Alfaiate ainda lá estava mas já não se achou em condições de leccionar. “Não consegues em Lisboa vai a Madrid” pensou consigo e foi lá que acabou a fazer um ano de curso intensivo na “La Confianza” (Escuela Superior de Sastreria, Sociedad de Sastres de España) e a trabalhar com o ilustre alfaiate D. Pedro Muñoz (número 72 da Calle Serrano), que quase levou o Ayres à comoção quando lhe disse o mês passado em Florença, em plena Pitti Uomo, que se mantinha informado sobre a carreira do seu pupilo.

Eu tenho 29, o Ayres 28, era de adivinhar alguns pontos em comum Quando cheguei àquela enorme loja e pedi que o chamassem aparece-me um portuense enérgico, com uma camisa colorida e uns suspensórios encarnados – um visual completamente distinto de todos os outros que lá trabalham. Eu gosto de falar de pessoas e a minha condição é a mais simples de todas – gostar delas. E eu gostei do Ayres desde o 1º e-mail. É do Porto mas namora uma lisboeta e Portugal já se sabe, tem semelhanças com um enorme open space. A conversa segue e percebemos que cresci a 300 metros da namorada e que, bem exploradas, as coincidências não ficariam por ali (viriam à baila mais tarde, já no Soho, na companhia do meu melhor amigo e de um vinho branco mediterrênico mas, what happens in London stays in London, não é assim?). O Ayres está na City londrina há mais de 3 anos e quando lá chegou não lhe faltou coragem para ir ao nº1 de Savile Row London procurar trabalho. Acabou compensado, saiu de lá com emprego. Mas o seu futuro arrisco, está na sua marca pessoal – a Ayres – e nos fatos e nas camisas que começou um dia a fazer para os amigos.

No mesmo sítio onde ouvi o Ayres contar-me tudo isto, esteve um dia a Camila Parker Bowles, enquanto o nosso amigo ultimava detalhes para entregar em mão um fato assertoado cinza rato de pura lâ virgem ao Príncipe Carlos. Não tenho queda alguma por personalidades, não encontro sentido nas Zonas VIPs das discotecas portuguesas e dou por mim a não saber o nome de metade das figuras que por lá passam. Mas se vos dissesse que não fiquei impressionado com a ideia de o Príncipe de Gales ter ali estado para que lhe fosse entregue em mão o seu fato novo mentir-vos-ia descaradamente. Quem também se deixou impressionar foram os media portugueses que não o largaram quando souberam disso. Fica aqui este pequeno exemplo que me vai impedir um dia, quando o Ayres for um grande alfaiate lisboeta ou portuense, de dizer “fui eu quem descobriu este gajo”.

Um abraço Ayres. Mas um pedido também. Este fim-de-semana vou finalmente ao Porto, pões-me uma cunha para fotografar o teu avô?

40 comentários:

Rui Quinta disse...

0 a 10...
12?!
:)

Sofia disse...

Adorei ler este texto...
Ainda por cima nasci e cresci perto da loja "dos Ayres" e o meu pai também é alfaiate. É bom saber que há jovens portugueses interessados em continuar essa arte (contra mim falo que nunca sequer me passou pela cabeça fazer disso uma carreira).

Continuação de boas fotografias! :)

Sandra Barradas disse...

Muito bom...Parabéns

Quando vi o avó tb achei que merecia um post...Espero que consiga.

Anónimo disse...

Lisboa é de facto um enorme open space :) Bom texto! Um dia compro um fato ao Ayres! Já agora sabes o preço de um custom made? abraço Johnny Le Deck

leo disse...

excelente

Clara H. disse...

Fantástico!!!
Que bom que há Portugueses felizes neste mundo Global.
Assim é que se dignifica Portugal.

Isabel I disse...

É sempre bom saber estas histórias de sucesso de conterrâneos nossos lá fora, gente com talento e audácia, que arrisca e vence.Às vezes interrogo-me: se temos pessoas com tanto valor que se vão embora, porque não saimos nós desta "apagada e vil tristeza"?

Anónimo disse...

estos post son los que hacen que cada semana esté pendiente de tu blog.

Ya tengo ganas de ver las fotos que harás en Porto.

Marta Pereira disse...

Et voilà! O tal alfaiate portuense :)

Anónimo disse...

Que excelente texto e que bela fotografia! Força Ayres, és o nosso Mourinho da alfaiataria!:) Abraço, André B

Ray Frensham disse...

Excelente medida .... e NO gravata-borboleta neste momento! Insólito tiro.

Marta disse...

Serás muito bem vindo no Porto :)

Francisca "Ayres" disse...

"e ousou- aventura mais incrível- viver a inteireza do possível."

Faz todo o sentido quando o caminho é talhado com paixão!

Vivo em mim um orgulho profundo por tudo isto!

da irmã "bebé"

Francisca "Ayres" disse...

Ao meu lado tenho um dos protagonistas deste magnifico texto, chama-se Ayres Alta Costura, o mestre, ou simplesmente o "Avô".
Aos 80 anos pergunta se nós temos um computador ou uma Internet,fica maravilhado e comovido quando vê espelhado num pequeno ecrã, algo desta dimensão! Está notoriamente babado!

Aguarda ansiosamente pelo fim de semana, a cunha está mais que metida;)

Anónimo disse...

E já agora, para compôr ainda mais o ramalhete...foi a minha mãe, alentejana de gema, quem costurou integralmente o vestido de noiva da Camila Parker Bowles (trabalha na Anna Valentine, em Marylebone).
Sara

A. disse...

Zé,

estive em Londres a passada de semana e, por tua causa, fui propositadamente à Saville Row só para aconchegar a vista com aquele espectáculo. E adorei aquele glam-gourmet, discreto, requintado e personalizado. O Ayres, esse, fica na agenda para quando se mudar para Lisboa.

Mafas disse...

Finalmente o Porto!

Unknown disse...

Bem-vindo ao Porto! Sugestões: Foz, jardins (Serralves, parque da cidade, Pálácio de Cristal) zona da baixa de dia e de noite para um copo, claro!

Anónimo disse...

Adorei o blog, suas fotos são incríveis!

pilar disse...

o meu avô também era alfaiate e é inesquecível o cheiro da lã passada a ferro, a régua de mangas que servia de cavalinho, a tesoura pesada e o giz. ficou-me na memória e no ADN.

Maria Júlia disse...

"QUANDO SOMOS BONS PARA OS OUTROS, SOMOS AINDA MELHORES PARA NÓS"


NÃO SÓ POR GOSTAREM DE PESSOAS MAS PELA AUDÁCIA QUE AMBOS POSSUEM...


O RECONHECIMENTO
E CLARO, O MEU ORGULHO ESPECIAL DE MÃE!!!

Anónimo disse...

Por tudo isto e pelo que o Ayres tem demonstrado bem haja sobretudo, a sua óptima educaçao

piipiis disse...

Muito giro este blog! I Like it. Tksss

Juana disse...

o Ayres é sem dúvida um homem liberal, que transporta consigo a marca da liberalidade da cidade Invicta. Os suspensórios vermelhos fazem toda a diferença. Gosto do texto e da fotografia do Ayres no seu ambiente de trabalho

Anónimo disse...

Obrigado a todos pelo feedback.Obrigado Zé pelo post que publicas-te sobre mim.Estou muito feliz.Recomendo a todos o seguimento do alfaiate lisboeta pois a meu parecer é excelente.

Beijos e abraços

Ayres

António Pista disse...

Por acaso não é o Ayres do Bruno Aleixo, pois não? :)


http://aguia-de-ouro.blogspot.com/

João Vilar disse...

Podia dizer ao Ayres que não pára de me surpreender, mas não era verdade!
Deste meu grande amigo espero só que a genuinidade e paixão com que vive se continue a reflectir na sua arte...

Um grande abraço e parabéns ao autor do Blog não só pelas imagens mas também pela forma como usa o "verbo"!

nusanto disse...

Grande Ayres!

Saudades de Londres meu amigo, das nossas pausas de repouso, das festas, das conversas, do torneio Mile End.....

Enfim...

Lembro-me quando me fizeste a primeira camisa e de ter tido uma sensação muito boa meu amigo.
Mais do que uma peça de roupa foi o passar uma tradição familiar, quase como pertencer a uma classe superior.

Acredito que pessoas como nós, que passam toda a nossa paixão no que fazem, eu na Joalharia, tu na Alfaiataria que poderemos trazer algo de novo a Portugal e ao Mundo.

Eu já retirei tudo o que podia de Londres. E tu, quando estiveres pronto, constrói a tua base aqui em Portugal.Dá-nos a honra de continuar a contar com uma boutique "Ayres"...


Grande abraço


Nuno Santos
www.elements.com.pt

António Prates disse...

Gostei do texto! Quase me senti o idílico Artur, nas aventuras e nas desventuras da Capital, do amigo Eça de Queirós.

Parabéns, e continuação de grandes descobertas!

Unknown disse...

Gostei bastante do seu texto. Fiquei a conhecer o Ayres, muitos parabéns aos 2.

Manuel Teles disse...

Amigo Ayres ,

É com orgulho que vejo o reflexo da tua paixão pela arte ser reconhecida no "post " e nos comentários.
Ao ler-lo relembrei a nossa passagem pela Pitti Uomo bom momento aquele que tive o prazer de assistir ao encontro com D. Pedro Muñoz , mais uma vez espelhaste a tua educação , gratidão e originalidade .
Despeço-me subscrevendo a dedicatória de Richard Anderson " good luck in savile row... "

Forte Abraço

Manuel Teles


P.S.
Parabéns "Alfaiate Lisboeta" pela forma como escreve e pela paixão com que o faz .

Sousa Magalhães disse...

É o reconhecimento do, actual e futuro, melhor alfaiate português.

Anónimo disse...

Grande Ayres! Que grande orgulho! O meu Bespoke!
E que surpresa de blog!! Mesmo 'a medida! Assenta mesmo bem!

Um forte Abraco

Andre

Paulo Baptista de Azevedo disse...

O Mundo estará aos teus pés...Um abraço XXL.Pépé

Anónimo disse...

ÉS O MAIOR!!!NÃO FOSSES TU MEU IRMÃO..RSRSRS









FREDERICO

mulher de gengibre disse...

Que sensações boas exprimes neste post, sempre de parabéns Alfaiate Lisboeta!!!

joao disse...

Ayres = show de bola!

eu disse...

Quem diria que viria a ter notícias de um amigo aqui no teu blog...
A tia do Ayres já me tinha dito que ele se estava a dar muito bem por Londres e é através dela (pois agora raramente encontro o irmão)que vou tendo notícias dele. Mas foi muito bom ver uma foto dele.
Gosto muito do Ayres e tenho ideia de que tem muito bom coração.
Convivemos muito a dada altura, pois namorou uma amiga minha (Ayres, lembras-te da Margarida?!?), mas infelizmente com o tempo acabamos por nos afastar.
Bom, terminando, deixo-te aqui um beijinho muito grande com votos de que faças muito sucesso!!!

Anónimo disse...

Miguel Bernardino

É com muito gosto que aqui deixo o meu comentário após ler este excelente texto acerca do futuro da alfaiataria em Portugal!

Fiquei muito muito orgulhoso por hoje ter conhecido, por aqui, o trabalho do Ayres!

É um excelente sinal de que esta antiga e nobre profissão ainda tem muitos anos de existência graças aos novos talentos!

Identifico-me e fiquei comovido porque trabalho durante as férias universitárias numa antiga Retrosaria, a Casa Marques, que fica em Rio Maior e que está aberta desde 1921 pelo pai do meu tio-avô! Desde os meus 15 anos que ganhei um enorme gosto em cortar os tecidos a metro, incluindo para alfaiate e costureiras!

Boa sorte e um bem haja,

MB

Anónimo disse...

He disse:
sinto orgulho que esta profissao tao digna e com valores maravilhosos volte a ter talentos!
Seria bom dar oportunidades de ensinamento a quem por amor a esta arte se interessa-se...
E como o Porto é sem duvida o melhor sitio para curtir talentos, sentirno-nos iamos muitissimo orgulhosos em termos na nossa cidade um Museu dos Alfaiates para o qual eu ofereceria algumas peças muito antigas do meu visavø alfaiate.